Morre em Tel Aviv Nili Tal, documentarista que contou a história de Bruna e das 'garotas do Brasil' na TV
- Gabriel Toueg
- Mar 9, 2024
- 4 min read
Updated: May 7, 2024

A jornalista e cineasta israelense Nili Tal, autora de uma filmografia de respeito sobre temas de relevância social, morreu em Tel Aviv na última quinta-feira (7), aos 80 anos. Entre seus diversos longas estão os documentários Bruna (2008) e The Girls from Brazil (2007), ambos mostrando a realidade de crianças brasileiras traficadas e adotadas em Israel.
Segundo o jornal israelense Yedioth Aharonot, Nili produziu 47 documentários ao longo da carreira. "Minha motivação vem de estar fazendo algo importante. Não se trata apenas de um meio de ganhar a vida para mim. Não se pode produzir filmes como estes sem uma forte motivação", Nili disse certa vez em entrevista ao jornal.
Pelo conjunto de sua obra, Nili ganhou dois importantes prêmios em Israel: um do Fórum de Documentários de Israel e um do Ministério da Cultura e Esportes, no campo da cinematografia. Sua carreira teve início logo após a saída do Exército, nos anos 1960, quando ela começou a escrever para o jornal Haaretz artigos abordando vício em drogas pesadas em Israel, abuso infantil, violência doméstica contra mulheres e muito mais.

Nili foi uma das poucas a retratar, de forma sensível e aprofundada, a história de Bruna Aparecida Vasconcelos, que foi sequestrada por uma falsa babá de sua casa em Curitiba quando tinha apenas 4 meses de idade, em 1986. A falsa babá, Marisa Vieira, era ligada à quadrilha de Arlete Hilu, que levou Bruna para o Paraguai. Na foto, Bruna, já jovem, aparece ao lado de Nili Tal, nas gravações do documentário que leva o nome dela.
Após o sequestro, Bruna foi traficada para Israel, onde foi adotada pelo casal Turgeman, de Lod, cidade próxima a Tel Aviv. O caso teve enorme repercussão à época: Bruna é tida como o único bebê sequestrado no Brasil para adoção ilegal que voltou à família biológica. Em 1988, a Suprema Corte israelense reverteu a adoção em favor da mãe de Bruna, Rosilda.
Para que Rosilda pudesse viajar e se manter em Israel, além de sustentar um processo caro e demorado na Justiça, um canal de TV da Inglaterra bancou os gastos - que teriam chegado perto de meio milhão de dólares à época, segundo reportagens publicadas na imprensa brasileira e israelense.
A TV promoveu um encontro desastroso, no meio da rua, inesperado e agressivo, entre Rosilda e a mãe adotiva de Bruna - já com o nome Caroline -, Simone Turgeman. O papel do canal e do jornalista Roger Cook no caso levantaram debates sobre sensacionalismo no tratamento do assunto - a família de Bruna nunca mais foi procurada depois de ela voltar.
Bruna, décadas depois
Com o passar dos anos, Nili quis saber o paradeiro de Bruna. Em 2006, 30 anos após o sequestro, a cineasta veio ao Brasil para investigar o que acontecera com a menina.
O que viu foi uma jovem com dois filhos, um de cada pai, nenhum dos pais presente em sua vida. Bruna engravidara do primeiro filho quando era, ela mesma, adolescente. Ela não falava mais com a mãe, que nos anos 1980 revirara mundos e fundos para conseguir a menina de volta. Ela morava com o pai, Luiz Américo, em um lar violento, e acabaria perdendo a guarda dos filhos para o Estado.
A situação virou o filme com o nome da menina. O documentário questionou se o destino de crianças pobres adotadas por famílias em países que gozam de melhor situação econômica não seria diferente - o argumento, não à toa, foi muito repetido nos anos 1980 e desde então por Arlete Hilu para justificar o tráfico.
As garotas do Brasil
O assunto conquistou o coração de Nili, que, mais tarde, veio ao Brasil com quatro meninas israelenses, Ayelet Zamir, Danala Drori e as gêmeas Alma e Anna Rahab. As quatro jovens tinham nascidas no Brasil e foram adotadas por casais israelenses após serem traficadas nos anos 1980. Ela contou, em uma entrevista:
Em maio de 2006, viajei para Curitiba, para procurar [Bruna]. Quando voltei para Israel, encontrei na internet uma carta de um jovem contando que tentou localizar sua mãe biológica no Brasil. Li então outra carta. Comecei a pesquisar o assunto e conheci 22 rapazes e moças que queriam encontrar suas mães biológicas. Decidi ajudar quatro. Quando voltei ao Brasil para a história da Bruna, em outubro de 2006, levei comigo as quatro jovens adotivas e uma mãe adotiva.
Nasceria, assim, The Girls from Brazil.

Nili tinha uma doença pulmonar e morreu no hospital Ichilov em consequência de complicações ligadas à enfermidade. Os filhos da cineasta, Yaron e Amir, enviaram nota ao jornal israelense Ynet em que afirmam que estão " tristes e chocados com sua morte prematura, ela era uma jovem em espírito e alma [que] viveu a vida até o último momento e agarrou-se a ela com todas as suas forças".
"Ela foi única e uma lutadora intransigente pela justiça. Estamos muito orgulhosos pela sua contribuição a [Israel] e à sociedade nas dezenas de filmes que ela fez".

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